A Secretaria de Estado de Segurança Pública de São Paulo é o Órgão máximo da organização policial do estado. A ela estão subordinadas a Polícia Civil e Polícia Militar, além do DETRAN e da Superintendência de Polícia Técnico-Científica. No dia 27 de novembro de 2006, o Instituto de Criminalística da Superintendência de Polícia Técnico-Científica da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo atendeu a um requerimento do então Delegado da 78ª Delegacia de Polícia da Capital. De acordo com a requisição, o objetivo da perícia era responder a alguns questionamentos sobre o poker poder ser considerado um jogo de azar. No laudo, emitido pela perícia técnica do Instituto de Criminalística, os peritos discorreram:

“A fim de responder este quesito, inferem os peritos que tal modalidade de jogo “TEXAS HOLD’EM”, é uma modalidade de jogo de “pôquer” (…) inferem os peritos que trata-se de um jogo de habilidade, pois ficou constatado que a habilidade do jogador que participa desta modalidade depende da memorização, das características (número e cor) das figuras apresentadas no decorrer do jogo, e do conhecimento das regras e estratégia de atuação em função destes fatores, sendo porém, o resultado final desta modalidade de jogo aleatório(…)”.

Quando finalmente chegamos em 2009, as dúvidas sobre o entendimento da legalidade da prática do poker no País já começavam a se dissipar. Porém, embora todos os laudos e estudos apontassem para o mesmo caminho, na maioria deles, a análise havia sido feita em uma amostragem relativamente pequena de mãos. Isso, até que a Rational Entertainment Enterprises Limited encomendou à Cigital Inc. uma nova pesquisa.

A Cigital está localizada na Virgínia do Norte e é uma empresa especializada em auxiliar clientes comerciais e governamentais a garantir a qualidade dos softwares e aperfeiçoar os seus processos de desenvolvimento. O estudo da Cigital Inc., não procurou quantificar o efeito da sorte no Texas Hold’em, mas forneceu estatísticas sobre a forma como os resultados das partidas são largamente determinados pelas decisões dos jogadores e não pelo azar.

Durante o estudo, foram examinadas 103 milhões demãos jogadas e constatou que, na maioria dos casos,(75,7% das vezes) o resultado da partida foi determinados sem que houvesse o showdown, ou seja, nenhum jogador teve que mostrar suas cartas. Nessas partidas, todos os jogadores desistem em favor de um único jogador ativo que ganha o pote. Nos 24,3% restantes dos casos, para ver a abertura das cartas, 50,3% são vencidas pelo jogador que podia fazer a melhor combinação com cinco cartas, das sete disponíveis – duas cartas de sua mão e mais cinco abertas na mesa. A outra quase metade das aberturas são ganhas por uma pessoa com uma mão de cinco cartas inferior, porque o jogador com a melhor mão inicial desistiu antes da abertura das cartas.

Desta forma, o estudo da Cigital conclui que:

“A partir desses números fica claro que, pelo menos dos dados da amostra, a maioria das partidas é determinada por alguma coisa que não o valor das cartas, visto que nenhum jogador revela qualquer carta para determinar o vencedor. Apenas raramente (cerca de 12% das mãos) o jogador que pode fazer a melhor mão de cinco cartas realmente joga a rodada completa até a abertura e ganha. A análise estatística das mãos nos dá segurança de que elas descrevem com exatidão o que foi jogado.”

Uma prova científica, realizada pela Universidade de Case Western Reserve, em Ohio nos Estados Unidos, também faz parte do acervo documental da CBTH. Em seu artigo, publicado na revista “Gambling Law Review” com o título de “Poker is a Skill”, realizado em 2008, foram feitos dois estudos assinados pelos Doutores Michael De Donno e Douglas Detterman. Ambos chegaram a uma conclusão que todos os jogadores de poker já têm conhecimento, mas que o cidadão comum desconhece. Segundo De Donno, este artigo é a evidência empírica de que o poker é um jogo de habilidade, e não de sorte. No primeiro estudo, 40 estudantes, com pouco ou nenhum conhecimento de poker, tiveram que jogar 200 mãos, uns contra os outros, em um software. Metade dos estudantes recebeu informações sobre estratégias básicas do poker, incluindo seleção de mãos iniciais e táticas e técnicas de jogo. A outra metade recebeu apenas a informação das regras básicas do jogo, sem qualquer dado estatístico, analítico ou estratégico.

Ao fim da experiência, o estudo conclui que os estudantes que tinham recebido lições de estratégia, tiveram um melhor desempenho que a outra metade. No segundo estudo, para confirmar a descoberta, De-Donno e Detterman fizeram a mesma experiência, só que aumentaram a quantidade de mãos para 700. A conclusão foi que todos os estudantes (de ambos os grupos) melhoraram os seus resultados, graças à prática prévia, mas os que tiveram lições estratégicas superaram os que tomaram decisões baseados apenas na experiência obtida com o jogo. No estudo, os pesquisadores ressaltam que: “Se ganhar fosse pura sorte, então as estratégias não teriam criado diferenças entre ambos os grupos” e concluem que: “a razão do poker parecer um jogo de azar é que a amostragem de uma sessão curta é pouco confiável. A sorte e os fatores randômicos disfarçam o fato de que o poker é um jogo de habilidade. Mas o nosso estudo prova que a habilidade é o fator determinante no longo prazo”. Baseado nos laudos técnicos e periciais, a CBTH precisava de um parecer jurídico, para endossar sua base documental. Desta forma, solicitaram um parecer de um dos maiores juristas de nosso País.

Em seu parecer, de 31 páginas, o jurista faz uma longa análise acerca da legalidade da prática do poker no País. Ao fim de seu parecer ele responde alguns questionamentos formulados pela Confederação Brasileira de Texas Hold’em e concluiu:

“Pode-se, então, concluir que o jogo de pôquer na modalidade Texas Hold’em, seja na forma de torneio, que ganha o jogador que por último ainda tem fichas, seja na forma de Cash Game, onde há apostas a cada rodada e ganha o que tiver mais fichas a serem trocadas por dinheiro, na essência o jogo é o mesmo nestas duas formas e malgrado possa haver estratégias diversas em cada qual, como assinalam HENDRICKX e outros, o sistema do jogo é o mesmo e em ambas as formas prevalece a habilidade e não a sorte.

Passo, então, a responder os quesitos, respostas estas já constantes do parecer, mas que destaco, em síntese a seguir:

O que é “Jogo de Azar” segundo a legislação brasileira,passíve1 de punição pela Lei de Contravenções Penais?

A Lei de Contravenções Penais no seu art. 50 § 3º alíneas “a”, “b” e “c” define o que seja Jogo de Azar e edita que se considera-se jogos de azar:

a) o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte;

b) as apostas sobre a corrida de cavalos fora de hipódromo ou em local onde sejam autorizadas;

c)as apostas sobre qualquer outra competição esportiva.

Exame pormenorizado do conceito de Jogo de Azar desenvolvido no Item 2 do parecer.

2) Jogo de pôquer é Jogo de Azar? A modalidade “Texas Hold’em” apresenta características que enaltecem ainda mais a habilidade e a técnica dos jogadores e, consequentemente, descarta o elemento sorte (ou azar) como elemento preponderante?

Conforme examinei, o jogo de pôquer não constitui Jogo de Azar, pois prepondera durante o desenrolar do jogo a habilidade, consistente no conhecimento das regras, na capacidade de realizar com rapidez cálculos matemáticos, na capacidade de blefar no instante certo, na observação da forma de jogar dos contendores, na observação psicológica dos mesmos. Estas características tornam-se ainda

mais presentes na modalidade Texas Hold’em, na qual o compartilhamento de até cinco das cartas abertas por todos os jogadores dá ênfase aos aspectos acima destacados, mormente a previsão das cartas dos opositores e o cálculo matemático.

3) A Alinea “c” do Art. 50 da Lei de Contravenções se aplica à prática do jogo de pôquer, inclusive à modalidade “Texas Hold’em”? Por quê?

Não se aplica. O que se pretende punir é a aposta de terceiro sobre o jogo que se desenrola e não a circunstância do jogador fazer aposta sobre o próprio jogo.

4) As conclusões constantes dos quesitos 2 e 3 valem para prática do jogo de pôquer tanto em torneios como em eventos “cash game”? Haveria alguma diferença, para fins de enquadramento da Lei de Contravenções, em relação à prática em torneios ou “cash game”? Não há qualquer diferença de análise para as duas formas de jogo, torneio ou cash game, pois em ambas o que prepondera é a habilidade.

5) A organização de campeonatos de pôquer, para inscrição pública, tanto para torneios como para “cash game”, é uma atividade lícita? Igualmente, não constitui qualquer ilicitude a organização de campeonatos de jogo lícito. Tal é consequência obrigatória do reconhecimento de que o Jogo de pôquer não é Jogo de Azar, sendo permitida a exploração do mesmo.”

6) As conclusões do parecer se estendem ao jogo de pôquer, inclusive na modalidade “Texas Hold’em”, praticado através de sítios na rede mundial de computadores?

Cabe observar que o software dá como ferramenta campo para anotar observações acerca dos adversários, campo este denominado notes. Ao enfrentar novamente qualquer destes jogadores as “notes” estarão disponíveis para que se lembre do seu padrão de comportamento.

O jogo por internet se retira a possibilidade da observação pessoal do comportamento dos adversários, no entanto, não desfaz a habilidade como preponderante, pois perduram como essenciais o conhecimento das regras, o cálculo matemático, a constatação da forma de jogar do adversário, a disciplina, a utilização de estratégias adequadas, a possibilidade de blefe, etc. Neste aspecto importante do jogo cabe ressaltara possibilidade de anotações para registro do perfil de jogo dos adversários, a ser inclusive utilizado em partidas futuras.”

Semana que vem mais um artigo.

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